quarta-feira, 25 de junho de 2008

6ª Parte do 5º Capítulo "Um dia no castelo"

Chegados aos estábulos, que ficavam nas traseiras do castelo, Lua correu para o seu pónei, afagando-lhe a cabeça. Era um belo animal de pêlo dourado, a quem a Princesa chamava carinhosamente de Espiga. Mas o que Lua mais queria era crescer para poder montar o fantástico Vampiro. Era ainda um cavalo novo, de apenas 4 anos, mas Lua desde logo se apaixonara por ele. Tinha um pêlo preto muito brilhante, incluindo cauda e crina. Apesar do nome, Vampiro era muito dócil e adorava que Lua o acarinhasse.
- Um dia, vais ser meu. - afirmou, depois de passar a sua mãozinha pelo dorso do animal. Colocou o seu chapéu preto que usava durante as aulas bem apertado para não cair e seguiu ao lado do professor, que trazia o pónei preso a uma corda numa das mãos e na outra o seu velho cavalo castanho. Foram para um terreno de terra batida, cercado por grades de madeira. Lá, Lua subiu no pónei com a ajuda do professor. Ainda era muito baixa para o conseguir fazer sozinha.
Aquela aula começou como todas as outras: para que Lua se habituasse ao Espiga e este à Princesa, davam meia dúzia de voltas ao recinto, com o professor a controlá-los, segurando sempre a corda do pónei. Só quando estavam os dois bem habituados um ao outro é que Lua podia dar umas pequenas corridas, primeiro dentro do recinto e depois nos campos relvados mais próximos. Nunca podia ir muito longe, pois o professor seguia-a de perto no seu cavalo. Se pudesse, Lua correria todos os campos, que um dia seriam sua propriedade. Aliás, o que por vezes mais queria fazer, era fugir das imediações do castelo, montada no Vampiro.
- Mantém as costas direitas. - aconselhou o professor.
Espiga era um pónei muito manso, nunca arranjara problemas e era um bom companheiro de aulas. Mantinha uma pose erecta enquanto a aula decorria e depois deliciava-se com relva fresca dos campos.
Contrariamente ao que acontecera no dia anterior, o sol brilhava e o céu estava limpo. Isso acontecia muitas vezes na Floresta Dourada: dias de chuva intensa seguidos de dias límpidos e quentes. Lua olhou o horizonte e mais uma vez ficou fascinada com o facto de não conseguir ver o fim dos terrenos pertencentes à sua família. Era das poucas coisas de que gostava em ser Princesa: tinha terrenos sem fim à sua disposição. Podia um dia construir uma casa pequena para o seu avô viver, assim ele não sentiria tanto a falta de uma vida humilde. Podia até conseguir com que trouxessem
o caixão da sua mãe e podia sepultá-la num pequeno palácio, todo de vidro.
Lua adorava sonha e imaginar um mundo só dela, onde apenas cabia felicidade. Também sonhava encontrar o Príncipe Encantado de que por vezes o professor Oceano falava, nos seus contos de fadas. E como Lua não conhecia ninguém para além das pessoas do castelo, exceptuando o avô, a Princesa imaginava que o seu Príncipe Encantado era o professor. Antes de adormecer, inventava grandes romances na sua mente, em que Oceano aparecia num cavalo branco, a salvava daquele castelo horrível e fugiam os dois para bem longe.
Claro que Lua nunca partilhou estes pensamentos com ninguém. A sua paixão pelo professor era secreta e nem mesmo o avô, para quem Lua quase não guardava segredos, a conhecia.
Passou algumas horas da sua tarde a cavalgar no pequeno pónei, sempre sob o olhar atento do professor. Viram Rafael passar a cavalo num dos campos mais afastados, mas não fizeram caso. Lua já estava habituada a ver o pai por aqueles lados. Nas suas primeiras aulas, ele ainda a fora visitar, só para se certificar de que tudo estava bem. Mas ao fim de alguns dias, como nada de novo acontecia, limitava-se a dar o seu passeio diário pelos campos verdes. O cavalo de Rafael era um grande animal branco, de quem Lua não gostava muito, por ser um pouco selvagem. Quase nunca obedecia ao seu professor de equitação, nunca deixava que a menina lhe passasse a mão, e a única pessoa capaz de o controlar era mesmo Rafael. Quando o via passar ao longe, montado naquela fera, Lua imaginava que o pai um dia também fora o Príncipe Encantado da mãe, no seu cavalo branco. Mas esse Príncipe tornara-se num monstro, devido a um feitiço provocado pela tristeza, e que necessitava agora de um novo amor para o curar. Mas enquanto isso não acontecia, Lua sofria por ter um pai ausente e que a culpava injustamente pela morte da mãe.
- Muito bem, menina! Portou-se lindamente nesta aula. Nos primeiros dias, eu achei que tinha um talento natural para a equitação, mas agora tenho a certeza. Soube manter a pose correcta e mostrar confiança é um bom princípio para se se uma óptima cavaleira. - o professor ajudou-a a descer, enquanto a elogiava efusivamente. Lua ficou muito contente com as palavras do professor, pois cavalgar era algo que naturalmente gostava. Sentia-se livre, longe das grandes paredes e regras do castelo. Agradeceu os elogios, tirou o chapéu e fez o caminho de regresso sempre ao lado do professor e a perguntar quando poderia montar um cavalo a sério, como o Vampiro. O professor riu-se e depois pousou uma das suas mãos calejadas no ombro de Lua.
- Ainda é muito pequena para isso. Um cavalo nem sentiria o seu peso, o que seria um perigo. Talvez daqui a uns três ou quatro anos.
Lua ficou ligeiramente frustrada, mas acabou por esquecer o assunto.
Quando chegou ao castelo, encontrou Rossana à porta, que a acompanhou até ao quarto. Lua passou o seu corpo por água de rosas em menos de cinco minutos, pois sabia que àquela hora, o lanche estaria pronto.
A Princesa lanchava sempre sozinha. A bem dizer, Lua até preferia que assim fosse, já que as refeições principais eram sempre momentos de grande tensão. Eram raras as vezes em que surgia um tema de conversa, e quando isso acontecia, nunca trocavam mais que meia dúzia de frases.
Sentou-se à mesa, ainda muito corada, e comeu várias fatias bolo e bebeu dois copos de sumo natural. Rossana esteve sempre ao lado da menina. Desde que a ama se reformara, a principal responsável por Lua era a jovem empregada.
- Porque é que ficas sempre a olhar para mim e não lanchas comigo? - inquiriu Lua, achando descabida a ideia de a empregada ficar todas as vezes de pé, enquanto a via devorar os melhores bolos e pães aquecidos.